Há umas boas décadas venho identificando-me com a defesa do que se usou chamar de Direitos Humanos. No início nossas ações eram basicamente de enfrentamento do Estado, truculento e cerceador das liberdades políticas e de organização social. Das cartas de protesto enviadas às autoridades repressoras nos anos 1980 ao modelo de comunicação virtual da ONG DHNet e ao status de ministério de uma Secretaria Especial de Direitos Humanos muita coisa mudou no País. Mas, às vezes me pego a pensar: – Por que precisamos fazer isso? Parece tão óbvio que o homem deve respeitar a vida e deixá-la fluir garbosa e viçosa que às vezes me enerva a alma ter que brigar para manter ativo esse fluxo.
Ao contrário do que possa parecer ao observador desatento não amo essa luta sem quartel e sem fim, prefiro ocupar o meu tempo de não trabalho com o ócio. Sim o ócio. Como ensina Rubem Alves, é bem melhor levar os olhos para passear – nada de caminhadas com cara de malhação –, passeios, estímulos à mente e ao espírito do que ocupá-los com a pesquisa de filigranas jurídicas que possam impedir uma injustiça social de ser perpetrada. Tenho a convicção que passar momentos com a família e os amigos para falar das belezas da natureza e da imaginação humana são bem mais interessantes do que ter que se envolver na luta por Direitos Humanos. Boa parte dos militantes de Direitos Humanos que conheço também gostaria de dedicar mais tempo ao não-fazer-nada, este óleo do espírito, mas isso não se fará possível enquanto houver homens marginalizados por outros homens em relação ao acesso à dignidade, alimentação, moradia, educação, saúde, trabalho e lazer.
Espero que chegue o dia em que precisemos explicar – como muita dificuldade – aos mais jovens o que era a luta por Direitos Humanos; um tempo de intransigência que virou memória. Enquanto isso não se torna realidade teremos que dividir o tempo e as nossas energias entre o olhar perdido sobre o mar, o encanto do por do sol atrás das serras, o saborear de uma boa cachaça (para quem gosta), o prazer da leitura, o espreguiçar num fim de tarde e lutar por justiça e paz. Grande ironia, não é?